27 julho 2008

"Life on Mars"

Ultimamente ando vendo muitas séries inglesas. Já citei aqui Doctor Who, que virou uma das minhas favoritas (e a 4a temporada foi uma das melhores), e se lembro bem, Torchwood, um spin-off da série do Doutor, que é uma série para adultos fantástica, tanto roteiro quanto produção. Ainda tem The I.T. Crowd, que os mais geeks conhecem (está na 2a temporada), e Red Dwarf, uma série que eu considero "intraduzível", por causa de tantos cacos e gírias locais (ficção científica com humor). Agora vou citar mais uma, Life on Mars.
Muitos quando vêem esse nome pensam que é uma série de ficção científica. Cláudia pensou isso também. Mas na verdade é uma série policial. O por quê do nome? A música "Life on Mars", single lançado em 1973, pelo "camaleão do rock" David Bowie. E tem a ver com a história, que é razoavelmente simples: Um detetive da polícia, Sam Tyler, na busca por informações que levem ao paradeiro da sua parceira e namorada (sequestrada por um serial killer), é atropelado por um carro, e de repente, acorda e se vê em 1973. Nada muda e tudo muda na vida dele: Ele continua policial, trabalhando na mesma delegacia, morando na mesma cidade (Manchester)... Só que 33 anos antes (a série é de 2006). Daí... Começa o choque de culturas e a investigação policial, que faz a série ser tão interessante. Afinal, ele é um policial dos anos 2000, confrontando os métodos e práticas da polícia dos anos 1970, no interior da Inglaterra.

O que aconteceu com ele? Bem, supomos todos nós que ele está em 2006, em coma, no hospital, e tudo o que acontece ao seu redor é fruto da sua imaginação. Mas ao mesmo tempo, o curioso é que ele imagina toda uma cidade, uma vida com uma riqueza de detalhes impressionante. Se temos o controle dos nossos sonhos, poderíamos tornar a nossa história ao nosso favor. Não é bem assim que acontece: O choque de culturas, a caracterização, e os crimes, que acontecem e ele tem que resolver, as pessoas que morrem, as negativas que ele recebe... O chefe dele (Gene Hunt) é a completa antítese dele, e as discussões entre eles estão entre as coisas mais engraçadas da série, o cara age como se fosse um xerife de uma cidade do Velho Oeste.

A dúvida está presente o tempo todo sobre Sam, que fala no início de cada episódio, que não sabe se está louco, se está em coma ou que realmente viajou no tempo. Em vários momentos ele ouve sinais como que de aparelhos médicos, gente falando com ele, e uma garotinha agarrada a um palhaço, que ele dialoga e que aparece sempre na televisão, na madrugada, fora do ar.

A caracterização é muito bem-feita, e faz a gente se divertir com as referências, elementos e detalhes. Vemos muito do que foi os anos 1970 nos Estados Unidos, mas pouco do que foi em outros países. Essa é uma oportunidade de ver como foram "aqueles loucos anos" nas Ilhas Britânicas.

Interessante avaliar as diferenças das polícias: Se em 2000 há uma ênfase forte em perícia forense, em 1970 a solução é espancar alguns suspeitos até que eles falem algo. Nada de proteger testemunhas, ou escudos e capacetes para a polícia contra multidões enfurecidas: Cada um pega uma "ferramenta" (marreta, pedaço de pau, etc) e vai para cima. Vemos ocorrências de provas plantadas, confissões arrancadas a base de muita pancada, mentiras, gente sendo presa sem motivo aparente, machismo (a policial feminina é formada em psicologia mas é ignorada por quase todos), suborno... Ou seja, dá para concluir que a polícia brasileira parou, em boa parte, nos anos 1970. Notável a semelhança! E o dono do bar onde eles bebem é jamaicano (e o reggae surgindo no horizonte), que acha estranho "ter uma televisão no bar".

Cada episódio tem um foco: Em um, o início das rivalidades do futebol (mostrando os dois times da cidade, o United e o City), que deu origem aos hooligans. Em outro, os sindicatos, e o início da decadência da indústria têxtil britânica (em 2006, Sam mora num loft que foi construído numa antiga fábrica de tecidos). Em mais um, os "gângsters" (não é bem o termo, mas que seja), que mandam na cidade, inclusive na polícia (à base de muita propina). E por aí vai.

É uma série curta: 2 temporadas, 8 episódios cada. Episódios longos, quase 1 hora cada (sem os comerciais). Ganhou o BAFTA (o "Oscar" inglês) e o Emmy (o "Oscar" da TV), e seguindo a trilha de The IT Crowd e The Office, terá uma versão estadunidense, a partir desse ano (já saiu o piloto em sites de torrent). Como quase sempre, a falta de dinheiro (tem poucos figurantes na cidade) são compensados com bons roteiros. Sim, a série é muito boa, e eu não sei como vai acabar (ainda estou na 1a temporada).

No Reino Unido, haverá uma nova série em 2009, Ashes to Ashes, que será uma continuação de Life on Mars, tanto que será mantida parte do elenco original. A referência é ao single do mesmo nome e de grande sucesso, de 1980, do David Bowie. Vamos ver se vai ser tão boa quanto a original.

Algumas poucas trívias:
  • Ele encontra com ele mesmo (em 1973, ele tinha 4 anos), e vê a mãe, nova, ser achacada por um "cobrador de impostos".
  • Sam Tyler estava ouvindo "Life on Mars", no seu iPod acoplado ao som do carro dele, quando aconteceu o atropelamento. E quando ele acorda em 1973, ele está ouvindo Life on Mars... Num toca-fitas (na verdade cartucho), num Ford Cortina (ou Granada, não lembro bem).
  • O ator que faz o Sam Tyler é o "Mestre" John Simm (quem assistiu a 3a temporada do Doutor entenderá).
  • O chefe de polícia berra num bar: "O quê? Não haverá uma mulher primeiro-ministro enquanto eu tiver um num buraco na minha bunda!" E Margaret Thatcher, então, assumiu seis anos depois...
  • E quando a Annie Cartwright (uma policial feminina) pergunta sobre as "alucinações" que o Sam vinha tendo, e ele responde: "Eu vou pedir ao Doctor Who para me receitar uma medicação...". E a série do Doutor, na sua primeira versão atravessou os anos 1970 afora (1963-1989).
  • Na versão americana, vai ter o Colm Meaney, o Chefe O'Brien de Star Trek: DS9.
Enfim, vejam. É uma série muito boa, eu recomendo.

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